No Dia do Livro e dos Direitos do Autor, instituído pela UNESCO e comemorado anualmente a 23 de Abril, foi organizado no Camões - Centro Cultural Português em Maputo, uma mesa redonda subordinada ao tema “Karingana wa Karingana: à volta da fogueira ou do telemóvel? Ler e contar histórias na era do smartphone”. Organizada e moderada pela tradutora Sandra Tamele, a mesa redonda teve como oradores o editor Celso Muinga e os livreiros Paulo Guerreiro e Tavares Cebola. O objectivo era reflectir a literatura actualmente, nos tempos da proliferação da tecnologia que faz nascer uma espécie de “geração de leitores digitais” em dispositivos móveis. Perante os desafios que o País enfrenta, tais como a acessibilidade, o estado das estradas, aldeias que ficam incomunicáveis na estação chuvosa, não se têm pensado no livro que “consegue transpôr barreiras ao passar de um servidor para um celular”, entende Sandra Tamele, avançando que este cenário cria oportunidades para tradutores moçambicanos, pois a digitalização no País encontra-se atrasada porque o “processo está em inglês e até Janeiro tinham sido publicados cerca de 3000 (três mil) livros, todos em língua inglesa”, constata. Sandra Tamele diz que a resistência à criação de conteúdos digitais é um problema comum da lusofonia. No caso de Moçambique, as editoras ainda não levam a sério a necessidade de produção de conteúdos digitais. A impressão continua o mecanismo mais usado, quando se pode aproveitar as ferramentas digitais para internacionalizar a produção literária de Moçambique. “Talvez seja momento de migrarmos. A literatura moçambicana é pouco conhecida no estrangeiro. Usar aquilo que é a produção local em conteúdos digitais é pensar na sua circulação além fronteiras”, disse. Não temos muitos “leitores digitais” O editor Celso Muianga diz que um dos grandes desafios de Moçambique é a formação de um público leitor. Esta necessidade faz com que Muinga não afirme que o livro digital colocará fim ao livro tradicional. O Editor da Fundação Fernando Leite Couto entende que é altura do Estado criar o gosto pela leitura nas pessoas. Acrescenta também que a solução para o alto nível de analfabetismo em Moçambique passa pelo livro físico como ferramenta pedagógica. “Ainda estamos no nível em que precisamos ensinar as pessoas o gosto pela leitura e isso ainda é feito com eficácia por via do livro físico. Para manusear as ferramentas digitais é preciso saber ler”, disse. É por isso que para Muinga, antes de pensar-se nas consequências da massificação do livro digital, deve formar-se um leitor que imigre do tradicional ao digital. Este, explica que ainda não se pode falar de uma rede de leitores digitais no país. “Não temos muitos leitores digitais, temos leitores, simplesmente. Não vamos chamar de leitor a quem em 15 minutos varre todos os títulos. Não parece que seja leitor”, disse. As soluções para o problema de leitura passam pela academia. Para Muianga os professores devem inspirar os alunos, de modo a evitar uma confusão básica como a diferença entre uma biblioteca e uma livraria. “é necessário convidar os professores e os alunos a lerem e frequentar os lugares de leitura, que toda a gente não confunda uma livraria, nem biblioteca e saibam para que servem”, explica o editor que acredita que por esta via pode se esperar que “as nossas bibliotecas andem cheias de leitores e não de pessoas que vão lá fazer um trabalho que o professor mandou”, disse. Conteúdos digitais respondem à escassez de bibliotecas e livrarias O livreiro Tavares Cebola defende a massificação de ferramentas digitais no país como material pedagógico. “Acredito que há um grande potencial para a população não escolarizada, um número bastante significativo em Moçambique, há possibilidade de aceder aos conteúdos educativos e literários através desses novos meios. Para quem não sabe ler e tem telemóvel e pode receber texto e aúdio, pode estar a receber conteúdos educativos”, disse Cebola. Tavares Cebola é da opinião que a proliferação da tecnologia móvel e de baixo custo não pode ser vista com maus olhos. “Estas tecnologias são uma solução para um país com poucas bibliotecas e livrarias”, disse avançando também que há muito discute-se o preço do livro em Moçambique. “Praticamente, há poucas bibliotecas, primeiro e, segundo, não são suficientemente alimentadas com novos conteúdos” entende e acredita que levando as pessoas às bibliotecas, os escritores e editores saem a ganhar, porque podem transitar ”de leitores de bibliotecas para gente que compra livros.” Na comemoração do Dia do Livro e Direitos de Autor fez-se sugestões de leitura da literatura de Moçambique, Angola, Brasil, Itália, Portugal, Países Nórdicos, Reino Unido, Suíça, França e Rússia.
Receba em primeira mão as notícias exclusivas veiculadas pela revista mais prestigiada de artes e cultura de Moçambique.